Sérgio Cosme
Foi num dia típico do que habitualmente encontramos pelo Oeste, com um sol ainda tímido e um vento que corria em todas as direções, que chegámos ao Noah Surf House, mesmo de frente para a praia, em Santa Cruz. Subimos até ao primeiro andar, onde se encontra a zona de restaurante o “Noah Beach House”, com um incrível pátio com piscina e vista mar. Foi nesta atmosfera descontraída e relaxada que começou a conversa com o Sérgio Cosme, piloto de jet ski e profissional das equipas de salvamento de ondas grandes. Apesar das muletas, na sequência de uma cirurgia ao joelho que resultou de um acidente de mota, foi a sua boa disposição e sentido de humor que dominaram desde o primeiro momento, e foi nesse tom que navegámos durante todo o encontro.
Sérgio nasceu e cresceu em Lisboa, mas o seu avô comprou casa em Santa Cruz e era para cá que vinha sempre que podia, principalmente durante o período das férias de verão. Sempre foi fascinado pelo mar e sempre foi um aventureiro. Lembra-se de ainda muito miúdo entrar mar adentro, curioso e destemido, e da infinita quantidade de vezes em que o nadador salvador vinha “ralhar” com a sua mãe. Desde os 3/ 4 anos que se lembra de andar com o tio de mota de água e do quão cedo ele próprio aprendeu a conduzi-la. Apesar disso, começou por sonhar com profissões mais vulgares como veterinário, médico e depois engenheiro civil. Mas a necessidade que sempre o acompanhou de testar os seus limites, e que levou consigo para o surf e também para as motas, guardava-lhe um destino diferente.
Apesar das vindas constantes a Santa Cruz, foi apenas em 2007 que comprou ali a sua casa. Mas foi anos antes, por volta de 2003/2004 que começou com amigos ainda por brincadeira no tow-in, uma modalidade de Surfing, onde o surfista é rebocado por um Jet-Ski, este método permite que o surfista entre nas ondas mais cedo do que o normal, e tem uma vantagem demonstrada nas situações em que a onda é muito grande e se move muito rapidamente. Depois, enquanto geria um bar na praia, tirou também o curso de nadador-salvador, como trabalhava na praia, se alguma coisa se passasse eu queria poder ajudar e sentia que precisava de ter os conhecimentos certos para o saber fazer da melhor forma.
Em 2007 foi vice-campeão nacional de Todo o Terreno na classe principal como copiloto e desde os 14 anos quando comprou a primeira prancha de surf que nunca parou de surfar,no reboque de surfistas encontrou o melhor desses dois mundos, a condução e o surf. Com esta sua profissão chegou também, a sua agora segunda casa, a Nazaré. A sua sede insaciável por adrenalina e a paixão pelo mar, teriam obrigatoriamente que o levar até às ondas grandes, nomeadamente na Praia do Norte, junto aos reconhecidos Nic von Rupp, Garrett McNamara, Alex Botelho, entre muitos outros. Eu costumo dizer que no porto de abrigo estão várias equipas mas lá dentro somos uma família. Esta afirmação explica de forma clara o porquê de ter sido apelidado de The Guardian Angel of Nazaré num documentário feito pela Red Bull.
Quando questionado sobre a preferência, entre a Nazaré e Santa Cruz, o seu coração fica dividido. Embora a sua casa oficial esteja em Santa Cruz, também já considera casa, ao lugar onde fica na metade do ano que passa habitualmente na Nazaré. Já as considero família e a vila recebeu-me mesmo de braços abertos. Sinto-me tanto em casa lá como aqui. Aqui não consigo ter tanto trabalho como na Nazaré e na Nazaré não consigo tanto descanso como aqui, diz entre risos. Quanto ao futuro, admite que gostaria de continuar nesta profissão até que se sinta capaz de o fazer, mas confessa um desejo. Custa-me saber o quanto a gasolina e o fumo da mota poluem o mar e também a forma como o barulho afeta os peixes. Gostava de estar envolvido num processo que levasse à criação de uma mota eléctrica, até já contactei a Tesla. A preocupação com o futuro do planeta e com a causa ambiental é algo que lhe diz muito e um dos motivos porque também gosta tanto do espaço do Noah, onde a sustentabilidade foi um dos conceitos chave.
O facto de ter tido este último susto e de estar ainda a recuperar de uma cirurgia, não lhe acalmou de forma nenhuma o desejo de voltar ao mar e é a ideia desse regresso o que verdadeiramente o motiva para trabalhar afincadamente na sua recuperação. Já sobre a possibilidade de voltar a viver em Lisboa, a resposta surge-lhe imediata e natural, a minha mãe continua a ter casa lá, mas mesmo assim, quando tenho de ir lá dois dias seguidos, venho dormir a Santa Cruz, acho que isso diz tudo. Aqui estou ao lado do mar, posso treinar e nem preciso de ginásio, posso ir correr para o pinhal. Aqui a minha vida é muito mais saudável. Para terminarmos este encontro, Sérgio aponta um único lugar como o possível, a praia, e de repente esquecemo-nos das suas muletas e da sua lesão no joelho e é para lá que seguimos, em direção ao seu habitat natural.