Histórias | Capítulo I Região de Leiria

Nuno Fonseca, Sound Particles

É na Incubadora IDDNET, Associação para a Promoção de Empreendedorismo e da Inovação situada em Leiria, que vamos encontrar Nuno Fonseca, o CEO da Sound Particles. A atmosfera do espaço da empresa onde nos recebe, apresenta uma simbiose quase perfeita entre tecnologia e cinema. Somos rapidamente transportados para uma dimensão diferente, que nos faz perceber, mesmo antes de a conversa começar, que iremos explorar um mundo novo, do qual será o Nuno a abrir-nos as portas. O que se passa ali parece-nos de alguma forma tão estrangeiro que a sensação é a de termos chegado a um território desconhecido, dentro do qual seguiremos com o Nuno enquanto guia. Sentamo-nos confortavelmente, apertamos os cintos de segurança imaginários e preparamo-nos para a descolagem.  

O Nuno nasceu e cresceu em Leiria e foi apenas com a entrada no ensino superior que temporariamente a abandonou. Ingressou no curso de Engenharia Informática no Instituto Superior Técnico e lá permaneceu durante cinco anos, até terminar os seus estudos. Enquanto nos fala sobre essa fase do seu percurso académico, partilha connosco uma particularidade desse período, enquanto estava a tirar a licenciatura, ao mesmo tempo ia assistir a aulas do Curso Superior de Composição na Escola Superior de Música. A música sempre foi uma das suas paixões, tendo frequentado aulas de música durante 4 anos ainda em Leiria e depois tendo seguido esse caminho de forma autodidata. É também neste momento que nos conta que nos resultados dos testes psicotécnicos do 9ºano obteve a mesma percentagem para engenharia e música, mas foi o seu lado mais nerd que acabou por falar mais alto. 

Findos os seus estudos em Lisboa regressa a Leiria, começando a trabalhar numa empresa de serviços informáticos, na qual permaneceria durante três anos. Quando começa a lecionar no Departamento de Engenharia Informática, algo que acabaria por fazer durante 15 anos, decide que se irá dedicar apenas ao ensino superior, de forma a poder ter mais tempo para algo a que chamou de os meus projetos malucos e esquisitos. Foi em 2012 que, tendo terminado o seu doutoramento, decidiu agarrar numa ideia que lhe tinha surgido quase 15 anos antes e que envolvia três das suas grandes paixões, a música, a tecnologia e o som. Eu achei que seria interessante podermos fazer a mesma coisa que já se fazia com os efeitos visuais no cinema, mas com sons, ou seja poder criar milhares de pequenos sons que depois todos juntos criassem a ilusão de sons absolutamente fantásticos. Intitulando-se de cromo informático, avançou para a criação do software, e em 2014, aquando da sua ida a Los Angeles para uma conferência, decidiu enviar alguns e-mails para alguns dos principais estúdios. Nesses e-mails explicava o tipo de tecnologia no qual estava a trabalhar e de que forma poderia ser usada por eles, e mostrava a sua disponibilidade para se poder encontrar com eles, caso existisse esse interesse, durante as duas semanas da sua estadia lá. A primeira resposta que eu tive foi da Skywalker Sound, que foi o estúdio de som criado pelo George Lucas aquando da Guerra das Estrelas, e que é atualmente o maior estúdio de som para cinema que existe em todo o mundo. Este foi o momento de viragem no seu percurso e o início de uma viagem extraordinária.

No espaço de seis meses, Nuno Fonseca estava a dar palestras na Universal, na Fox, na Warner Brothers, na Sony, na Paramount, mais tarde na Disney, na Pixar, em Stanford, na Apple, e a lista poderia continuar. O que naquela fase era apenas um protótipo suscitou interesse imediato por parte de vários desses estúdios, e poucos meses depois estava já a dar-lhes acesso a uma versão beta do software. Em 2015, esse mesmo software é usado pela primeira vez no remake do filme de terror “Poltergeist”. No final desse mesmo ano, é lançada a versão comercial do software, e como nesse período estava ainda a lecionar e não queria estar preocupado com questões de faturação e pagamentos, decidiu colocar a aplicação à venda. Contudo, as coisas continuaram a acontecer, em 2016 decide finalmente criar a empresa e em janeiro de 2017 mudam-se para a Incubadora. 

Hoje em dia o Nuno é responsável por uma equipa de 20 pessoas, com quem trabalha diariamente neste espaço, exceto com um dos elementos, que está sediado em Londres. A Sound Particles trabalha essencialmente com cinema e com videojogos. O software criado por si já foi entretanto utilizado em filmes e séries como “Game of Thrones”, “Star Wars” ou “Frozen”. Já na área dos videojogos trabalham com empresas como a Playstation, a Epic Games ou a Blizzard. De uma forma bastante simplista, o que esta sua aplicação veio permitir e trazer de novo foi a possibilidade de, utilizando um software de áudio 3D e conceitos de computação gráfica aplicados ao som, conseguir simular milhares de sons em simultâneo. Conta-nos que, nesta fase, estão já a pensar noutras potencialidades desta aplicação, particularmente para que músicos possam também tirar partido do som 3D. 

Sendo os EUA, em particular a Califórnia, o seu principal mercado, admite que a ideia de viver lá lhe chegou a passar pela cabeça, até porque antes da pandemia viajavam várias vezes por ano para Los Angeles e São Francisco. Mas a verdade é que, num mundo atualmente tão global, estarem a trabalhar em Leiria não é de forma nenhuma redutor ou impeditivo do que quer que seja. Para mim do ponto de vista de qualidade de vida é priceless, ou seja, quando eu demoro mais do que 7 minutos de casa ao trabalho já acho que está um trânsito infernal (risos). Apesar disso, confessa ter saudades de viajar e está ansioso por poderem regressar ao escritório, sendo que a equipa se mantém ainda a trabalhar em casa. Partilha connosco que, como forma de manterem o espírito de equipa, decidiram criar – embora virtualmente – as sextas feiras musicais. Sendo que mais de metade da equipa tem algum tipo de background nessa área, quinzenalmente juntam-se e cantam e tocam juntos. As diferentes velocidades de internet não facilitam a coordenação de sons e de vozes, mas quando estes encontros se tornarem presenciais, prometem transformar para sempre as festas de Natal da empresa.

Viver em Leiria é o melhor dos dois mundos. O melhor das grandes cidades e o melhor dos pequenos lugares, ou seja, por um lado temos as coisas que as grandes cidades têm e ao mesmo tempo as vantagens das cidades pequenas, como não haver trânsito. Estamos a 1h de Lisboa, estamos perto da praia, perto da neve, perto de tudo basicamente, e é por isso que tenciono continuar em Leiria e continuar a ter aqui a minha paz de espírito.