Matilde Leitão, Remote Portugal
Existem pessoas que são o verbo “ir”. Pessoas que encontraram as ferramentas para fazer de qualquer lugar a sua casa ou o seu trabalho, e que por isso não receiam a distância nem a ausência. Pessoas para quem a viagem é um ato constante e não um plano delimitado por datas que se congelam numa qualquer agenda. A Matilde é uma dessas pessoas e não é por isso de estranhar que a nossa conversa a tenha “apanhado” em paragens búlgaras, nesse país que agora escolheu como morada.
A Matilde licenciou-se em Terapia Ocupacional, uma área que sempre a apaixonou e na qual começou a trabalhar assim que terminou o curso. Contudo, foi durante umas férias com amigas que aleatoriamente descobriu no Facebook um curso sobre nomadismo digital e como trabalhar no online. Curiosa decidiu imediatamente inscrever-se, e a partir desse momento, a sua vida pessoal e profissional mudaram de forma drástica, o curso acabou e eu só pensava, eu quero fazer isto, eu preciso disto, e embora eu adore o meu trabalho eu vou estar sempre no mesmo sítio e isso não me faz sentido. O bichinho das viagens já existia, embora ainda não tivessem sido muitas até essa data, então nesse momento começou o plano do que seria a primeira grande viagem, 8 meses pela Ásia. Na altura comecei então o projeto Travelb4settle com o meu ex-namorado e a ideia era fazer um blog e escrever sobre as viagens.
No primeiro ano a base continuava a ser Portugal e após a exploração pela Ásia, seguiram-se 6 meses pela América do Sul. Hoje a mulher que sempre quis estar perto do mar por ter vivido e crescido em Santa Cruz, apaixonou-se pelas montanhas, e é em Bansko na Bulgária que vive há 1 ano e meio. Nos últimos dois anos, além do Travelb4settle, está envolvida numa ONG a “Bansko Lab” e nasceu ainda um novo grande projeto na sua vida – criado juntamente com outros dois co-fundadores – a “Remote Portugal”. A Remote é uma plataforma de educação e conexão no mundo do Trabalho Remoto, que agora se assume de forma oficial como Associação de Trabalho Remoto em Portugal. A ideia é ajudar portugueses a trabalhar remotamente ou mesmo nómadas digitais. Empresas a tornarem-se remotas, consultoria para espaços de coworking e coliving, como atrair essas pessoas que como nós trabalham remotamente e viajam há anos ou pessoas que começaram agora a trabalhar remotamente e que estão um bocadinho sem saber o que fazer.
Dentro do projeto da Remote, em 2020 criaram a “Remote Tour Portugal”, um projeto pioneiro em Portugal que visou demonstrar o melhor que o trabalho remoto tem para oferecer. Foi assim criada uma tour que durou 1 mês, e que incluiu também o centro de Portugal, com trabalhadores remotos e que se focou em 3 grandes pilares: Trabalhar, Viajar e Comunidade. Na região da Ria de Aveiro foi incrível, nós ficamos num espaço que era um alojamento rural que se estava a tentar tornar em coliving e daí o termos escolhido para esta colaboração. Ali percebemos claramente que já há esta consciencialização das necessidades dos trabalhadores digitais e dos trabalhadores remotos.
Para a Matilde uma das grandes mais valias desta mudança de estilo de vida e da forma como pode agora encarar o seu trabalho, foi a possibilidade de uma aprendizagem constante. A disponibilidade e a oferta cada vez maior de cursos online, permite-lhe estar sempre atenta às mudanças no mercado e poder atualizar-se e ganhar novas ferramentas sem ter de sair do mesmo lugar. Para mim, o meu maior valor na vida é a liberdade. E por isso é que quando soube o que era o nomadismo digital e o trabalho online foi “uau, isto é para mim”. É uma questão de pensar que hoje estou aqui e se quiser amanhã estou ali. Mas se eu quiser estar aqui um, dois ou três meses, estou. É mesmo a questão de poder fazer o que eu quero e quando eu quero.
Hoje o seu trabalho é muito mais do que um trabalho, é algo que encara com sentido de propósito e de missão. O desenvolvimento dos cursos, das ações de consultoria e de projetos como a “Remote Tour”, fazem com que possam depois receber o feedback de quem de facto os utiliza como alavanca de uma grande mudança profissional. Todos os participantes ficaram muito meus amigos, ainda ontem falava com uma rapariga que era daquelas que dizia “não, eu percebo mas isto não é para mim”, e agora veio ter comigo aqui a Bansko e é uma viajante que não pára quieta um segundo e que adora ter trabalho remoto.
O futuro imediato parece ser na Bulgária, mas é evidente durante toda a conversa que nunca será a longo prazo, eu sou nómada e não consigo estar muito tempo no mesmo sítio. Mais do que uma verdadeira embaixadora das inúmeras vantagens deste regime, a Matilde é uma embaixadora de todas as incríveis mudanças em que este estilo de vida pode traduzir-se. Eterna amante de viagens, de poder conhecer novas culturas e de sair da sua zona de conforto, o seu percurso envolverá sempre a partilha desses conhecimentos que vai bebendo de todos os lugares e de todas essas experiências. Um dos meus motes de vida é a colaboração. Acho que é a colaborar que podemos de facto fazer a diferença.