Histórias | Capítulo I Médio Tejo

Carlos Bernardo, O Meu Escritório é lá Fora!

Foi no coração do centro histórico da cidade de Abrantes, que fomos ao encontro de Carlos Bernardo. A fachada do edifício, marcada pelo traço da arte urbana, e coberta por uma série de padrões – que viríamos a saber, homenageiam os muitos azulejos espalhados pela cidade – não nos permitiu duvidar, estávamos no sítio certo. Foi ali que Carlos nos esperava, naquele que é o seu escritório, mas a que também chama de laboratório, de estúdio ou de galeria, e foi pela mão dele que seguimos, certos de uma viagem que não seguiria em linha reta, mas curiosos com um percurso que se anunciava invulgar.

Carlos Bernardo nasceu e cresceu na freguesia de Rossio ao Sul do Tejo. Ali conheceu uma infância e também uma adolescência que assume ter sido feliz e tranquila, sempre rodeado pelos pais, avós maternos e amigos. Sente-se um sortudo por ter nascido ali e pela forma como esse lugar construiu uma parte tão importante do seu carácter. Desde sempre se lembra de estar ligado ao associativismo, às dinâmicas culturais e desportivas e a um forte espírito de pertença e de comunidade. A importância dessas suas raízes, a esse que era nessa altura o seu “pequeno mundo” foi sendo continuamente fortalecida, mesmo quando a vida o levou para outras paragens. É do Rossio que guarda as suas memórias mais profundas, e a que ainda hoje regressa, através dos cheiros, das paisagens e acima de tudo, das pessoas. Cedo percebi que são de facto as pessoas que fazem os lugares. 

Desde sempre se sentiu como um pequeno explorador e essa sede de ver mais além, alimentou-a ainda em criança através de livros do universo fantástico e depois numa fase adolescente através de livros de viagem. Foi assim, de forma prematura que foi percebendo que a sua imaginação lhe criava uma liberdade sem barreiras nem limites, liberdade essa que combinava com a que sempre sentiu ao longo de todo o seu crescimento no Rossio. Do passado histórico desse lugar e da grande influência do rio na paisagem e nas pessoas, bebeu também grande parte da inspiração que um dia viria a fazer dele um contador de histórias e acima de tudo, um sonhador e um eterno romântico como se confessa. 

O seu percurso académico levou-o até Coimbra para estudar Engenharia Civil, mas rapidamente percebeu que nunca se saberia enquadrar na ideia de um escritório convencional. Contudo, apesar de ter tido essa tomada de consciência relativamente cedo, houve todo um caminho a percorrer, até conseguir deslindar por onde e para onde queria seguir. Ao longo dessa jornada nasceu então o projeto, “O Meu Escritório é lá Fora!”. Nessa primeira fase enquanto blog de viagens, onde através de pessoas partilhava as suas experiências em muitos lugares, dentro e fora do país, mas que ao longo do tempo se foi metamorfoseando e que é hoje uma magazine digital, em breve física também. Vejo-me como um construtor de caminhos, de pontes que ligam lugares, pessoas, conceitos, visões e inspirações.

Para alguém que se vê como um “construtor”, conceitos como a rotina, a monotonia ou a inércia são dilacerantes. É dentro do seu eterno desassossego e de uma busca incessante pelo novo, pelo diferente e pelo que ainda não foi feito, que se posiciona, e foi o resultado desse tremor que tem em si, que fez nascer o Estúdio Tipo-grafia, um estúdio de comunicação e design. Sou fascinado pelo pensamento e pela concretização criativa, mas acima de tudo pela comunicação nas suas mais diversas formas, seja através da escrita, do filme, da fotografia ou do som. Mas se tivesse de escolher apenas uma, seria a fotografia. Essa é sem dúvida a minha forma de arte e de contar histórias de eleição. Enquanto líder deste projeto, mais do que gerir pessoas, gosta de descobrir e de potenciar talentos, e de poder transformar o seu escritório num laboratório de ideias e de experiências.

Para Carlos, viver no Centro, particularmente em Abrantes, não foi uma escolha, mas sim uma consequência natural das suas vivências. Já vi muitos lugares mas ainda hoje continuo a ficar fascinado com este. Este é o único onde de facto me sinto em casa. Rapidamente percebemos que é um grande embaixador deste território. Descreve-nos a multiplicidade de culturas e paisagens que nele encontramos, começando pelo norte do concelho marcado pela floresta e pela barragem de Castelo de Bode, passando pelo centro onde se distingue a arquitetura, o rio Tejo e o centro histórico e terminando a sul, na zona de planície e um lugar muito especial para ele. É essa diversidade que vê como o maior potencial deste lugar e o que faz dele tão especial e diferente de todos os outros. Aliado a tudo isto, ainda estamos numa posição geográfica privilegiada, a apenas 1 hora de Lisboa, do mar, da serra ou de Espanha.

Quanto ao futuro, as certezas são poucas, em consequência da sua forma de estar e de viver tão intensa e efervescente e da necessidade de constante mudança e transformação. Talvez a única seja a de que se imagina a continuar a viver neste lugar, com a Liliana, a sua mulher e a pequena Alice. Tudo o resto é um mar de infinitas possibilidades. Pertenço àquele grupo de pessoas que acredita que pode mudar o Mundo e é isso que tento ir fazendo, devagar, à minha escala, começando por este lugar a que chamo Casa.